Lázaro
Barreto – Divinópolis, MG. Filho de José
Valentim Barreto e Isolina Gonçalves Guimarães, falecidos;casado
com Inês Belém Barreto. Pai de Ana Paula Barreto Lopasso
casada com Guilherme Barreto Lopasso; pai também de Paulo Henrique
Belém Barreto, solteiro. Ambos os filhos vivem em São
Paulo. Publicou muitos livros de contos e poemas e de pesquisas históricas
e genealógicas. E tem cerca de 15 outros livros inéditos,
entre os quais 8 romances.
RESSONÂNCIAS*
Lázaro
Barreto
De repente
a poesia é de uma leveza praticável
(fios de painas no ar luminoso,
respingos de novas luas nos velhos escuros).
Os poemas são curtos e breves,
bailam nos olhos do leitor,
cantam nos ouvidos do leitor,
passam depressa e depressa
voltam,
ubíquos nas páginas da noite,
melodiosos no turbilhão da noite,
São
rapidamente legíveis?
Demoradamente plausíveis?
O leitor sente que cada um vai
e volta.
Sente que cada um estará sempre ali
no meio da noite.
Bem dentro de quem ele é ele, o poema?
Dentro de quem encontra ressonância!
“O
anjo da terra no ventre único
No baú de veludo
O findo ano
Sem censura.”
*
Escrito depois de ler CENÁRIO NOTURNO (Poesia), de Andréia
Donadon Leal, Editora Aldrava Letras e Artes, Mariana, MG, 2007
TOPONÍMIA
DAS MINAS E DOS CAMPOS GERAIS
Cabeceira
do Buriti
Brejo dos Mártires
Córrego dos Nobres
Água Emendada
Chapada das Perdizes
Onça de Pitangui
Curinhatá
Abre
Campos, Passa Vinte Velho, Barra da Cega, Borda Mata
Campo do Meio, Catas Altas da Noruega, Pinta-Pau, Rio Espera
Cava de Fora, Curralinho de Dentro, Soca-Pó,Sombra da Tarde
Juiz de Fora, Mãe dos Homens, Penha do Capim, Fecho do Funil
São Sebastião das Três Orelhas, Quem-Quem, Palmeiras
de Fora
Santa Rita de Pacas, Quebra Viola, Pedra Menina, Quenta-Sol
Divino do Canivete, Três Corações, Volta Bala, Cana
do Reino
Cajuru do Cervo, Três Pontas, Vargem do Paga Bem, Diamantina!
Caracóis de Cima, Passa Quatro, Mata do Sino,Gambá de
Baixo
Belo
Horizonte!
Cocais da Estrela
Seio de Abraão
Guarda dos Ferreiros
Senhora dos Remédios
Dores do Indaiá
Acaba Mundo.
DENTRO
DOS HORIZONTES
A
cidade “apresenta em seus principais lineamentos topográficos
a bela forma de um vasto anfiteatro aberto para o Oriente, como que
para receber desde cedo os benéficos raios solares, e, encostando-se
ao Sul, a Serra do Curral que a protege contra os ventos frios e úmidos
que nessa direção atravessam as serras de Ouro Branco
e da Moeda”. Aarão Reis, em 1893.
Avenida Afonso Pena
O
amoroso transcorrer das pessoas
em suas pernas e braços mentais.
O corredor das atividades
sob à luz das necessidades.
O céu que se abaixa no Horto,
eleva-se no Calafate.
A vívida expressão de interesse pelo que der e vier
no trânsito dos momentos mais aproximados.
O caminho dos objetivos
na mobilidade das pessoas blindadas,
sob à luz das necessidades,
nos pontos obscuros das transigências,
como numa tomada panorâmica
de um filme de Helvécio Ratton.
Praça
Raul Soares
A
manhã plúmbea, a tarde amarronzada,
as sutilezas dos segredos das moitas delineadas.
As células corporais renovam-se de vez em quando,
assim como a corporação vegetativa dos jardins
centrais e dos quintais adjacentes.
Todas as pessoas bonitas e confiáveis evocam
a inauguração católica apostólica romana
do Congresso Eucarístico em 1936,
ainda hoje vigente
na perfeita circularidade dos aspectos visuais,
na aclimatação das circunstâncias e dos parâmetros,
na exclusão das contrariedades....
Uma certa doçura até hoje, nublada na lembrança?
As redondezas hoje erguidas enevoaram-se?
Parque
Municipal
Quem
estiver prestes a desistir de tudo,
a desabar sob o reles céu cotidiano,
a sofrer a falência dos sentidos das coisas,
que dê um pulo ao Parque Municipal,
que percorra as alamedas da educação física
e assim defenestre a falta de sentido das coisas
e assim sinta apolíneo e peripatético,
e o bom sentido da vida a brilhar nos olhos das pessoas
novamente auto-reencontradas
nas caminhadas a favor das articulações.
Ali é onde e quando o paciente encontra
o mote da oralidade e do coloquialismo
na fragrância das espécies vegetais já extintas
em suas matas ciliares, em seus rincões distanciados.
É ali mesmo que nos compenetramos de que, oh!,
se se perdemos a libido, perderemos a graça de viver...
E assim imbuídos do clima do lugar,
num átimo a nossa cabeça volta a seu lugar,
o corpo se empertiga.
E o mundo recomeça a girar.
E, filhos doentios do êxodo rural, relembramos
os arejados dias lá da roça, onde os animais
nunca erravam, nunca erram.
Por que não desfrutar a boa parte da roça
bem aqui nesse fluido, nessa verde parte da roça,
bem no coração da cidade?
Praça
da Estação Ferroviária
O
chefe do trem recolhia as passagens,
a repetir: “Belo! Belo! Belo Horizonte!”
Eu sofreava a cogitação, fechava os olhos nas curvas.
“Você vai gostar da Capital”, a moça dizia.
Se se joga uma pedra, ela vira passarinho?, eu pensava.
As casas passam no escuro, iluminadas:
nunca tinha visto tamanho prodígio!
As rodas arrancavam fogos nos trilhos,
rilhavam nas curvas do Calafate.
Eu via os arcos e as flechas de pedras caiadas,
a face dos bichos selvagens da modernidade.
A praça abarcava os canteiros de automóveis.
As luzes no chão de vidro negro....
A cidade nua estampava num átimo o cenário
de um filme policial com Humphrey Bogart,
bem assim de repente
aos olhos atônitos dos roceiros que chegavam,
tecendo em si as novas perplexidades palpitantes
dos próximos dias.
Praça
Sete de Setembro
Belo
Horizonte tem seus dias de outras terras?
A folgança domingueira nas alamedas triangulares do Parque:
teria lá uma vez ou outra similar em outras paragens?
Foi aqui
na parte da tarde da Afonso Pena que Mário de Andrade
viu o céu pintado por pincéis de macaúbas?
Os ares de outras terras em nossos dias....
A cidade evoca contos passadistas ou futuristas?
Enéas encalhado nas costas da Líbia,
revê cenas dos filmes da refrega greco-troiana?
Uma réplica bem aqui do bosque sagrado de outras eras?
Ah! mais uma vez as sombras das distâncias
são as voragens mais próximas!
Ah! O pirulito da Praça Sete é o ponto de exclamação
da bela arte de Antônio Gonçalves Gravatá,
pai de nosso saudoso amigo , o bibliófilo
Hélio Gravatá, que Deus os tenham nas alteadas
e aladas praças de Lá!
Pampulha
As
temporárias bonanças do espírito humano
na modernidade sadia que respiramos....
As pessoas bem formadas, efígies poéticas
(JK, Lúcio Costa, Drummond, Rubião),
estão na conjuntura dos melhores fragmentos.
Os relevos da lisura, os azulejos dinâmicos.
O marco inicial da periférica grandeza
(a igreja futurista, o jardim zoológico, o lago artificial,
o museu de arte, a casa do baile, o iate tênis clube,
o mineirão, o mineirinho), leva ao povo
as regalias da elite?
Os pássaros cantam nos dedos de Portinari.
As caminhadas salutares no contorno da lagoa.
Arquitetura reflorida de Niemeyer.
As formas arredondadas dos jardins de Burle Marx:
tanta vida nas efígies da beleza
da beleza mais pública e notória.
Praça
da Liberdade
Como
se a visse pela primeira vez,
ainda agora o olhar não se contém
nos circulares imóveis desdobrados,
cujos interiores são de palacetes,
estruturais e funcionais e aprazíveis
aptos a “preservar a tradição liberal”,
como diria o estadista Milton Campos.
Normalmente as pessoas que procuram a plenitude
fogem de um vazio que ocupa o lugar da plenitude.
Mas bem ali a esteira de outras luzes azula
o verde fugindo entre as rosas geométricas,
como diria Carlos Drummond de Andrade,
sob o renque das palmeiras imperiais.
Os
Bairros Telúricos
Belo
Horizonte é o círculo de seus bairros
de nomes alpestres, rupestres, silvestres
(Prado, Calafate, Gameleira, Barreiro, Serra, Mangabeira, Jaraguá,
Barroca, Buritis,
Horto, Floresta, Lagoinha, Cachoeirinha, Pampulha, Bonfim, Caiçara,
Belvedere):
cada um com a sua particularidade fisionômica,
seus arranjos de ruas e flores e janelas e pessoas:
de um lado a sintonia dos monossílabos orais,
do outro a arrumação das roupas no corpo e na alma
de uma humanidade aluada em pleno solstício tropical.
Seus acidentes toponímicos, concatenados nas redondezas
das captações visuais,
tinham lá seus brejos e córregos, morros e fontes,
nascedouros e cemitérios,
tudo de útil e agradável para aglutinar as etnias, os
étimos,
as etnologias,
os adventícios de toda parte,
na parte mais preciosa das minas gerais de tantas freguesias
e primazias.
aqui dentro e diante dos belos horizontes
“Palpita em cada coração
o pássaro da liberdade”, como já disse a nossa bem
amada
Henriqueta Lisboa.
gotas
de chuva e raios de sol
Antologia de haicias - compilação de Lázaro Barreto
Flor
desabrochada:
rompem-se por entre as pétalas
pérolas de mel
Déia
Leal
Dança
de peixe
deixe que eu nade
no olhar
Beatriz Amaral
Nós e
os bambus
Os nós não impedem
a busca do sol
Débora Novais de
Castro
Do meio das sombras
surge um rosto sorridente –
lua desta noite.
Edson Kenji Iura
Pronto para o
bote
na samambaia-de-metro
um gato escondido
Estela Bonini
Pitangas maduras
Vermelhinhas, vermelhinhas,
lábios de menina
Hazel de São Francisco
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Quer
a luz do poste
um pouquinho do seu ouro,
ipê amarelo!
J.B. Donadon-Leal
O poeta cria
o sonho
compensando o que lhe falta
com o muito que lhe sobra
Olga Savary
Um susto logo
cedo:
na caixa do correio,
duas mariposas!
Paulo Franchetti
Nas cidades agora
todos os vagalumes
usam pilhas
Sérgio Dal Maso
Bem penteados
os pensamentos
nos cabelos brancos
Soraya de Castro Guedes
No jardim florido
mais parecendo outra flor
a bela criança
Wilson de Oliveira Jasa
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In:
CASTRO, Débora Novaes de (coord.) Haicais ao Sol
- II antologia, SP: VipWork, 2008