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crônicas
A
Poesia
Vânia
Moreira Diniz
O tempo caminhou. Não mais aquele sonho,
mas a presença da alegria e do encanto especialmente inspirador.
Tudo parecia um conto de fadas quando a menina começou a crescer.
E quanto mais crescia a presença da realidade não caminhava
no mesmo ritmo. Ela tinha a sensação que vivia momentos
intercalados, muito intensos e inexoravelmente irreais. Não
sabia precisar onde estava, porque viera para esse mundo e as razões.
Mas amava explorar com olhos brilhantes a perseverante natureza, bela
e aconchegante como se ali fosse uma casa ofertada por um Deus indefinido.
Os dias corriam, a passagem era por vezes áspera,
porém havia debaixo dos grilhões que machucavam seus
pés, uma maciez protetora e amena que a fazia andar mais célere
em direção à sua meta.
Tudo era tão subjetivo que não sabia
se vivia, cumpria uma finalidade ou deixava-se arrastar dolentemente.
Até que encontrou sua própria alma e pode captar o sentido
do que antes não soubera compreender: A poesia. Ela ali estava
iluminando seus dias, esquivando o mal, e completando o sentido de
uma existência, bem como dos vôos quase literais em busca
de realização. A poesia sublimava quaisquer momentos
difíceis ou ásperos ou irônicos e cicatrizava
as feridas que às vezes teimavam em reabrir.
A poesia permitia suas buscas, perdoava suas imperfeições
e reestruturava o sentido da vida afastando as dúvidas e erguendo-a
nas eventuais quedas dolorosas. Só ela conseguia elevá-la
na frágil dignidade humana e nos fracassos inconseqüentes.
Sempre convivera e tivera como companheira a poesia,
só que naquele momento tinha a consciência iluminada
da fortaleza terna, do vigor que nascera e ia um dia morrer com ela.
Por causa dela estava ali, com os olhos de frente
para o sol, em convivência com a luz das estrelas, sabendo definir
a cor do céu e pairar entre nuvens brancas e macias. E por
causa dela se aninhava no solo verde de capim macio, admirando como
irmãs as flores que lhe comunicavam segredos, as folhas que
lhe davam esperanças, os lagos e rios que lavavam seus machucados
na água corrente e o mar gigante e esplendoroso captando cada
momento e transmitindo o eco de sua voz majestosa num murmúrio
sedutor.
A poesia expressava também sua harmonia no
canto dos pássaros que lhe faziam bem e na musicalidade das
notas rítmicas que lhe acalmavam. E representava o seu universo
total tanto físico como anímico.
Assim ela cresceu, tornou-se mulher, compartilhou
das sensações as mais estranhas e profundas, amadureceu
e se envolveu para sempre na poesia que jamais a deixaria cair inerte
nem permitiria que ela não atingisse o sonho maior e mais profundo.
Esse sonho que era compartilhado envolto na inspiração
que não a deixaria fenecer, mas ao contrário lhe daria
as mãos constantemente e se misturaria aos anseios de seu coração.
A Poesia, companheira, irmã, reflexo de sua
alma e que não a deixaria morrer jamais.
(MEDO)
NO ELEVADOR
Hernany
Luiz Tafuri Ferreira Júnior
Elevadores
não são figuras pelas quais eu nutra sentimentos positivos.
Realmente, eu não gosto desse veículo que é tido
por muitos como um dos mais seguros do mundo. Como tudo o que sobe
um dia desce, eu prefiro mesmo me locomover via escada. Vai que o
dito cujo não esteja com sua manutenção em dia…e
aí? Vou dar trabalho para os bombeiros por que?
Fazendo uma reflexão um tanto imparcial,
podemos notar com que frieza os ocupantes de tão utilizado
meio de locomoção tratam-se. Na maioria das vezes nem
um cumprimento, nem um bom dia, como vai?, nada!
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100
ANOS DE ARTE NIKKEY NO BRASIL
Na clara manhã brasileira.
Ao sol da manhã
Uma gota de orvalho
Precioso diamante
Matsuo Bashô*(1644-1694)
*tradução de Kimi Takenaka e Alberto
Marsicano
A
fala dos imigrantes japoneses e de seus descendentes, os seus extraordinários
feitos nas áreas dos negócios, da agricultura, da tecnologia,
da cultura e das artes, está sendo justamente enumerados e
louvados nestes 100 anos de imigração no Brasil. Diante
desta avalanche de concretitude eu prefiro, pelo meu lado, apontar
o não-dito, o sugerido, o esboçado. É aqui, nesta
manifestação superior da forma, que se apresenta a magnífica
contribuição da cultura japonesa ao Ocidente e, no nosso
caso, ao Brasil.
Jacob
Klintowitz
Crítico de arte e Curador do Museu Brasileiro
da Escultura
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BISCOITOS
MARIA
LUIZA FALCÃO
Terça-feira,
tarde chuvosa, 17:30 horas, 28/11/2007 – no HSE RJ
No
meio do engarrafamento na Avenida Brasil, RJ, direção
Caxias, libertei o pensamento, e o olhar passeou pelo entorno. Tudo
conhecido, nada novo, a não ser aquela figura humana, encostada
à amurada de um dos viadutos de acesso à Ponte Rio-Niterói.
De bermuda e camiseta, empunha numa das mãos um guarda-chuvas
aberto contra a garoa e na outra carrega dois grandes sacos repletos
de algo que não entendi à primeira vista. Mas, afinal,
que diabos faz ela ali?
A cena inusitada trouxe-me de volta o pensamento.
Imaginei um carro enguiçado, um acidente, isso, aquilo, até
mesmo que ela estivesse tentando atravessar as pistas.
Quanta ignorância a minha...
Aquela mulher solitária, na chuva, em meio
ao trânsito lento, simplesmente tentava, em investidas arriscadas,
vender biscoitos. Era este o conteúdo dos sacos.
O pensamento voou de novo, mas desta vez, na direção
de tantos brasileiros que, como aquela mulher, driblam carros, etc
e tal, para trabalhar e levar para casa o dinheiro honesto.
Lembrei-me de meu pai citando um contemporâneo
seu que disse: “chegará o dia em que o brasileiro sentirá
vergonha de ser honesto”. Particularmente discordo, e exemplos
vivos como esta mulher reforçam o meu pensar. Honestidade nunca
sai de moda. O povo não quer “bolsa-esmola”, mas
sim, trabalho digno para viver e criar a família. Ao contrário
do que muitos pensam, a “lei de Gerson”, aquela de levar
vantagem em tudo, não pegou. O povo brasileiro é trabalhador
e honesto.
O resto é exceção.
MARIA
LUIZA FALCÃO
Delegada Regional da APPERJ em Belo Horizonte
ASSOCIAÇÃO PROFISSIONAL DE POETAS NO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO
Fundada em 11 de abril de 1989
Saite referendado pela UNESCO no Diretório Mundial de Poesia
Reconhecida como de Utilidade Pública Municipal, através
da Lei n° 3353 / 2001
www.apperj.com.br
apperj@apperj.com.br
PAUS,
PILAS E CONTOS
Urda
Alice Klueger
Só
os muito jovens não se lembram: para quem, como eu, já
passou dos 40, não dá para esquecer. Na minha vida vivi
muitas moedas brasileiras: cruzeiros, cruzeiro novo, de novo cruzeiro,
cruzado, cruzado novo, cruzeiro de novo, cruzeiro real e real. Se
não esqueci de nenhuma, foi isso aí, essa coleção
enorme de nomes de moedas, as quais variavam incrivelmente - lembram-se
que chegamos a ter 84% de inflação num só mês,
isto é, em fevereiro de 1990? Isso levava a gente a ganhar
milhões num mês, e alguns mil no mês seguinte,
e por aí afora. Os mais velhos, com certeza, se lembram muito
bem.
O que me impressiona nisso tudo, nessa loucura
das variações das moedas brasileiras, é que sempre
houve unidades da moeda que nunca mudaram, que cada brasileiro sempre
soube usar com toda a segurança, não importava que nome
o governo estivesse dando ao nosso inflacionado dinheiro. E que unidades
eram essas? Eram o conto, o pau e o pila.
Quem não sabe o quanto valem dez contos?
E dez pilas? Nas loucuras que a inflação trouxe para
o nosso país, sempre se entendeu perfeitamente quando alguém
disse:
- Isso aqui custou 400 paus!
Paus, pilas e contos - unidades invariáveis
de todas as nossas moedas, as que sempre deram segurança ao
nosso povo na hora de falar em dinheiro. Quanto valem? Ninguém
sabe, mas todos calculam através delas com precisão.
E de onde vieram tais unidades? Eu sempre acreditara que eram criações
do nosso criativo povo brasileiro, até que fui a Portugal.
Na primeira hora em Lisboa, cambiei 100 dólares
- e recebi 12 contos e pouco, em escudos. Quando me falaram que dava
12 contos, já avaliei que tinha a ver com 12.000 escudos. Só
perguntei para confirmar. Oriunda de um país de muitas moedas,
ouvir falar em contos, lá do outro lado do oceano, fez com
que eu me sentisse em casa, que passasse a saber, na hora, quantos
paus e pilas podia gastar naquele país tão doce. E,
nos dias que se seguiram, ouvi muitas vezes os portugueses falando
nessas moedas alternativas com a mesma naturalidade com que nós
falamos. Em Lisboa, como no Brasil, se podia comprar coisas em paus,
pilas e contos, do mesmo jeito que aqui.
Daí, ano passado, estive em Moçambique,
país africano de língua portuguesa, na costa do Índico.
Em Moçambique, a moeda é o metical, inflacionada moeda
corroída por vinte anos de guerra. Com um dólar, pode-se
comprar 12.000 meticais, e as coisas são baratíssimas.
Qual não foi minha surpresa, então, ao chegar lá
e ouvir as pessoas falando em pilas, paus e contos com a mesma naturalidade
com que falamos aqui! Não sei bem como é que funciona
por lá, com uma moeda tão desvalorizada (se me lembro,
o Brasil já teve moeda desvalorizada assim), mas quando alguém
me dizia que tal coisa custava tantos contos, eu entendia perfeitamente.
Pelas ruas de Maputo, a capital de Moçambique, linda cidade
que a gente nem imagina existir (antiga Lourenço Marques),
comprei capulanas por pilas; castanhas de caju por paus; lindas pulseiras
de jade por contos. Às vezes, para exercitar o uso da moeda
local, ia a confeitarias comer doces por meticais, mas só como
curiosidade de turista - pra que usar meticais, quando se podia, como
no Brasil, comprar-se tudo por pilas, paus e contos?
E eu que tinha pensado que tais unidades monetárias
fossem invenções nossas, brasileiras! Primeiro dou de
cara com elas em Portugal, que foi, com certeza, que as inventou -
mais tarde, encontro-as lá na distante África, tão
entendíveis quanto o são aqui no Brasil.
Ah! A força da língua e da cultura
portuguesas! Quão forte foi Portugal, ao sair pelos caminhos
dos mares a conquistar o mundo! Onde estiveram os portugueses, a exemplo
do que ocorre no Brasil, temos países mais ternos, mais tolerantes,
mais doces, muito e muito diferentes, por exemplo, dos países
que a Inglaterra colonizou, duros, frios e intolerantes. Sou fã
incondicional da cultura portuguesa, essa cultura suave e doce que
a nossa pátria ancestral espalhou por quatro continentes. E
fiquei mais fã ainda ao descobrir que, no mundo de origem portuguesa,
não há necessidade de se saber, sequer, o valor das
moedas: basta que saibamos as palavras pila, pau e conto.
Blumenau, 07 de setembro de 1998.
Urda
Alice Klueger
Crônica
O irresistível inconsciente
e o fenómeno da fé
Por
: Eugénio de Sá
Vice-Presidente da Academia Virtual Poética do Brasil
Enquanto o temperamento o herdamos nos genes
e se submete ao que os astros nos ditam no acto de nascer, o carácter,
esse, vai-se moldando e caracterizando à medida que vamos adquirindo
conhecimentos e recebendo influências. É assim que se gera
uma personalidade, rica ou pobre nos princípios, forte ou fraca
na vontade, enérgica ou indolente na determinação,
romântica nos impulsos do coração, ou analítica
e consistente na razão, feita de indomáveis excessos,
ou de contidas temperanças.
Tudo isto nos define com seres racionais mas
– quiçá providencialmente - limitados ao uso do
consciente, isto é: daquilo que nos é dado conhecer de
nós próprios, uma vez que o inconsciente que, identicamente,
partilha o nosso cérebro, permanece hermético e inquestionável.
Quem nos criou soube o que fez com esta máquina
de concepção impressionante que somos todos nós.
Porque está para além da imaginação humana
o que poderia acontecer se tivéssemos acesso ao nosso inconsciente
e o que poderíamos fazer com isso, porque não somos só
energia pura, mas dotados daquilo a que se convencionou chamar de alma.
Sem dúvida que constituiu, para nós,
um aliciante apelo a visão de uma outra dimensão que está
para além de uma interpretação linear com base
no que nos dizem os nossos sentidos. É comum, por isso, a tentativa
de exploração do denominado sobrenatural, do transcendente,
tanto em peças media como noutras formas mais reservadas de abordagem
do tema.
Pode haver outra vida para além da presente
ou não faria sentido esta escassa temporalidade da nossa existência.
Pode o espírito que nos anima ter habitado outros corpos no passado
e, porventura, vir a encarnar outros no futuro. É uma teoria
possível, como possíveis são outras, mais ou menos
apoiadas pela religião ou por movimentos espiritualistas, todas
credoras de respeito e, certamente, passíveis de cuidada reflexão.
Investigações de fenómenos
ditos paranormais, recolha de depoimentos de indivíduos que passaram
por experiências de morte aparente e “voltaram à
vida”, propõem apoiar, através dessas casuísticas
ocorrências, a teorização da vida após a
morte.
Pode o nosso inconsciente - a grande parte submersa
(ou invisível) deste iceberg que é o cérebro humano
- vir a explicar muitas das dúvidas que nos são propostas
pela vontade que nos exige essas explicações, ou irá
permanecerá obscuro tudo o que está para além da
nossa imediata compreensão?
De tudo o que foi dito emerge um maravilhoso
enigma, que nos consagra definitivamente como entes eleitos deste planeta;
a fé que aflora ao nosso coração perante situações
incontroláveis, mormente as mais penosas. A fé em algo
de divino, que, bastas vezes, se corporiza ou evoca num Santo, na Virgem
ou mesmo em Deus, que imaginamos simplistamente feito à nossa
imagem e semelhança, ou, na inversa; sem essa presunção.
Fé que nos leva a prometer algo que nos é caro ou de difícil
concretização, ou mesmo um sacrifício físico
ou de outra natureza e que, ao cumprimos essa promessa, por aquilo que
consideramos a Graça recebida, nos transmite uma grande paz de
espírito, como um dever cumprido.
Pessoalmente, sou disso vivo testemunho. Ainda
agora – e de novo – na presença da imagem da Virgem
Imaculada, em Fátima, eu e minha mulher fomos invadidos por grande
comoção. Mais; um acontecimento posterior, quase imediato,
que ambos vivemos intensamente, faz-nos acreditar que não se
trata de qualquer ilusão criada no âmbito de exacerbadas
crenças religiosas ou da influência de qualquer irracional
e incontrolada histeria, mas verdadeiramente brotada da interiorização
de uma acção divina, uma Graça que vem dos Céus,
ou de outra dimensão, realmente.
Não tenho a pretensão de querer
explicar o que quer que seja sobre o assunto, mas, tão-somente,
trazer a estas linhas a minha funda convicção da presença
em nós do divino. Como cristão baptizado, concentro a
minha própria fé num ou mais ícones da minha religião;
a católica, sem qualquer menosprezo por outros que professam
diferentes credos, uma vez que os fundamentos são em tudo similares.
É só uma questão de nomenclatura.
Lisboa, 16 de Dezembro de 2007
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