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Jornal
Aldrava Cultural |
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A
poesia de Remisson Aniceto |
Remisson
Aniceto
Remisson
Aniceto nasceu em Nova Era, MG. Desde muito cedo tomou gosto
pela leitura, incentivado pelo seu pai que não dispensava nem
bula de remédio. Começou a escrever aos oito anos e pouco
depois lia alguns clássicos na biblioteca pública. Mudou-se
para São Paulo em 1979, à procura de trabalho. Em 1983
o jornal A Gazeta Esportiva, de São Paulo, publicou um poema
seu e em 1984 e 1985 foi premiado nos Concursos de Contos e Poesias
da CMTC (SP). Nos anos seguintes continuou escrevendo - principalmente
poesia - e em 2006 conseguiu o 2º lugar no Prêmio Cataratas,
da Fundação Cultural de Foz do Iguaçu (PR), com
a poesia "Transição" e uma menção
honrosa no Prêmio Cidadão de Poesia, de Limeira, com o
mesmo trabalho. Em seguida, outra menção honrosa com o
soneto "Classificado", no Prêmio Filogônio Barbosa
(ES). Sua poesia "Herança" também recebeu o
prêmio de edição no Prêmio Valdeck Almeida
de Jesus de Poesia 2007, cujo livro está no prelo. Suas resenhas
no site www.leialivro.sp.gov.br são muito comentadas e lidas
nas rádios da Rede USP (SP). Sempre que tal acontece, recebe
livros à sua escolha. De 1982 até 2002 teve poesias suas
divulgadas em quatro coletâneas, ambas esgotadas. Alguns sites
e jornais de pequenas tiragens já estão divulgando seu
trabalho.
Transição
É
tão fria a cova e tão escuro o horto
onde depositam meu corpo doente!
_ Como a cova é fria se o corpo é morto?
A partir de agora só a alma sente...
Ah!
Esta cama rude onde estou deitado
e este quarto escuro e tão bem fechado!
Tento levantar, mas estou tão cansado...
Que rumor é esse ali no quarto ao lado?
Há
um jardim bem perto: sinto o odor das flores.
Quero levantar, mas estou tão cansado...
Estou tão cansado mas não sinto dores.
E o rumor aumenta ali no quarto ao lado.
_
Desçam o caixão! _ diz alguém lá fora.
Quem morreu enquanto estive dormindo?
Bem perto da porta ouço alguém que chora,
lamentando a sorte de quem vai partindo.
Quero
levantar, faço força tamanha
mas tenho as mãos inertes e o corpo duro.
Agora o padre reza numa língua estranha,
enquanto fico preso neste quarto escuro.
Está
caindo terra sobre o telhado.
Parece que o mundo está desabando...
Falta-me o ar neste quarto fechado
e lá fora há uma multidão chorando.
Sinto
um tremor leve, um breve arrepio...
Já quase nada mais estou sentindo.
Por que não me tiram deste quarto frio?
Alguém morreu enquanto estive dormindo.
É
tão fria a cova e tão escuro o horto
onde depositam meu corpo doente!
_ Como a cova é fria se o corpo é morto?
A partir de agora só a alma sente...
Poesia
classificada em 2º lugar no Prêmio Cataratas 2006, da Fundação
Cultural de Foz do Iguaçu,
e menção honrosa no Prêmio Cidadão de Poesia,
de Limeira - SP
Herança
A
confecção deste poema foi um caso à parte, diferente
dos demais poemas meus,
que normalmente levam horas, às vezes dias para ser finalizados.
Herança veio de uma
golfada; nasceu, se muito, em trinta minutos, já pronto pra se
mostrar ao mundo.
E
eu morro a cada dia
quando cada coisa morre.
Outrora Deus me socorria;
agora já não socorre...
Vai
um pássaro, coitadinho,
de hirtas e opacas asas.
Vai com ele um bocadinho
da minha alegria tão rasa.
Vão-se
o amigo, o cão, o gato, o boi,
tudo vai nesta infalível jornada.
Só fica a angústia do que foi
na minha memória cansada.
Até
um jovem filho se vai
sem mesmo saber pra onde,
na vã liberdade que atrai
e mil armadilhas esconde.
Nenhuma
alegria perdura
e todo gozo é passageiro.
Só de tristeza há fartura
todo dia, o ano inteiro...
Quando
eu me for [e será breve!]
levarei comigo esta carga.
Não quero que alguém herde
tanta lembrança amarga.
Súplica
Reza
por mim, amor.
Reza por mim
e não serei um mero grão disperso,
e não serei um anel de Saturno
desgarrado, solto no espaço-tempo
da Eternidade.
Que aqui tudo é mistério,
tudo é descoberta,
há outro sentido,
outro conceito de Existência.
Aqui não há espera,
só a lembrança fugaz,
só a vaga imagem do teu rosto
na moldura do Infinito.
Não te deixei, amor,
roubaram-me de ti,
despejando-me no vácuo do tempo.
Reza por mim,
fumaça disforme ora diluída,
ora rejuntada,
assumindo formas várias e inúteis,
bailando aos dissabores
da inconsciência.
Reza por mim, amor.
Imagina-me como um lago
de águas puras, serenas,
e assim hei de ser
para matar minha sede
de ti.
Vestuário
Roupas,
roupas,
vestimentas,
enganos do corpo,
engodos, farsas.
Panos, panos,
linhos grossos,
fininhos,
obstrução de caminhos...
Chuva
Um
corpo na mesa -
e lá
fora o dia chora
águas
de tristeza
Áurea
Faço poemas
em versos negros
e versos brancos
para que todo poema
seja livre.
Realeza
Por
que em tudo quanto vejo cuido vê-la?
Por que não fico um segundo desta vida
sem pensar na minha amada e esquecê-la,
se é uma jóia que pra mim está perdida?
A
cada fim-de-semana tão sofrido
me transformo nas flores que lhe oferto,
mágica forma que creio ter aprendido
para vê-la, pra senti-la, pra estar perto...
Abdico
hoje da tristeza,
do sofrer e da amargura abdico,
qual um rei que não quer na dor a realeza.
E
como antes para tê-la eu me dedico,
para ser rei, mas rei feliz e tenho certeza:
quando a tiver, serei de todos o mais rico!
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