Jornal Aldrava Cultural
ISSN 1519-9665
S B P A - Aldravipeia
Artes Visuais
Cartas

Aldravipeia

Sociedade idealizada por Andreia Donadon Leal
Logo criada por Gabriel Bicalho

 

Aldravipeia

J. B. Donadon-Leal

Na apresentação das aldravias, em dezembro 2010, os poetas aldravistas anunciaram que as aldravias não seriam fôrmas, inscritas apenas numa proposição sintética de seis versos univocabulares, mas formas abertas às mais diversas experiências poéticas que tenham como prioritária a palavra. Ficava claro que não anunciávamos unicamente um novo tipo de “poema”, mas propúnhamos uma nova “poesia” que expressasse a atualidade de qualquer tempo (aquela da pragmática sensação do presente eterno), em que a atitude própria da construção das metonímias faz emergir a força da palavra do meio do caldo visual que, nesta atualidade, inunda os meios de comunicação e, reiteradamente, cobra a veiculação das ideias através do que esta segunda década do XXI acostumou-se a chamar de novas narrativas.
Acontece que na reflexão aldravista da abertura do século XXI, a narrativa é a estrutura básica de qualquer texto. Seja numa aldravia, encadeamento de seis versos univocabulares, seja num romance, sucessão de eventos em torno de um tema, a narrativa dá estrutura ao que será reconhecido como texto. Não são novas narrativas as que presenciamos nas veiculações dos novos meios – são novos envelopes textuais às estruturas narrativas básicas – evocação, conflito e resolução.
Historicamente a narrativa, o ato de relatar, constitui a forma básica das relações sociais, uma vez que aquele que presencia um acontecimento sente-se no dever de relatá-lo aos demais, seja para simplesmente dar ciência, seja para construir alerta. O primeiro caso tem cunho noticioso e o segundo didático.
Como os discursos sociais são recortados por relações de poder, os relatos simples dão lugar aos relatos elaborados para conquistarem finalidades didáticas específicas – nas famílias, para garantirem que as regras internas não sejam contaminadas por regras externas; nas religiões, para garantirem seus dogmas; nos estados, para garantirem seus domínios. Todos estes estamentos, em todos os tempos, elegem algum paradigma literário, de cujas narrativas constroem seus heróis para ditarem as diretrizes a serem seguidas pelas novas gerações – o avô é o herói familiar; um profeta, um pajé, um pastor será o porta-voz de uma divindade; um rei, uma rainha, um presidente, um general será um herói nacional.
Entre os tantos exemplos históricos de relatos, podemos citar os dos livros sagrados e as epopeias. Os livros sagrados, cada civilização à sua maneira, constroem relatos da criação do mundo e das lutas pelas organizações sociais; as epopeias (seja Gilgamesh da Mesopotâmia ou Odisseia da Grécia) são poemas que relatam feitos na construção de heróis; mitos que são tomados como exemplo de força e poder.
Imaginando a possibilidade de um relato poético instaurar a construção não de um herói, persona divinizada, mas de um tema heróico, grandioso, capaz de elevar uma palavra da simples condição de palavra simples à de palavra grávida de sentidos heróicos e grandiosos, apresentamos a possibilidade de construção de um conjunto de aldravias temáticas, ao qual se designará por aldravipeia, conjunto de 20 aldravias dedicadas a uma palavra, que deverá aparecer ou ser aludida em todas as aldravias desse conjunto.
Não se trata de uma nova narrativa, mas de uma nova formulação de texto que utiliza um conjunto definido de uma forma poética específica, a aldravia, colocando em destaque um conceito, um nome, um lugar, um sentimento, uma sensação, explorando a polifonia, isto é, a multidão de sentidos que explodem de cada palavra de uma língua.
As possibilidades de exploração de sentidos diferentes de uma palavra são experimentadas cada vez que nós percebemos universos discursivos diferentes. Azul para o universo discursivo de um aeronauta pode ter sentido de céu aberto; mas pode ser possibilidade de emprego, se assumir o sentido de empresa aérea; pode representar a monotonia de uma longa viagem, a estabilidade de um voo sem turbulência, o poder do pássaro, a alegria da vastidão do céu ou a tristeza de ser minúsculo nessa mesma vastidão; o pavor de ter azul acima e negritude na barriga do avião. Que dizer então de multidão de sentidos de azul nas religiões, nos símbolos nacionais e institucionais, nos esportes, nas artes, nos sentimentos. Não importa a palavra; todas são polifônicas; todas têm inúmeros sentidos. Para construir uma aldravipeia, basta experimentar uma palavra em lugares e situações diferentes, compondo 20 aldravias a partir de uma mesma palavra.
O nome aldravia foi sugerido por Andreia Donadon Leal em 2010 e agora, inspirada no livro transmutações de Gabriel Bicalho, construído por aldravias dedicadas à palavra pedra, publicado em Germinais (2011), primeiro livro mundial de aldravias, essa inventora de palavras propõe aldravipeia para designar o conjunto de 20 (vinte) aldravias dedicadas a uma palavra. Em 20 aldravias, uma palavra poderá ser experimentada em 20 diferentes universos discursivos. Bom sempre lembrar que a aldravia é um poema autônomo, de seis versos univocabulares, e deverá manter sua autonomia e unicidade, mesmo quando faz parte de uma aldravipeia.

Aldravipeia
Andreia Donadon Leal
LÁGRIMAS
I
apaixonadas
torrentes
lacrimais
olhos
saudade
poesia
II
compreensão
lacrimais
versos
carpidos
desafinam
linométricas
III
fino
choro
finíssima
lágrima
orvalhada
alma
IV
fio
aquoso
fiapo
sentimental
finíssimo
choro
V
líquido
lacrimal
transborda
dor
ou
alegria
VI
lágrimas
inundação
devastadora
de
alma
transborda
VII
quentes
lágrimas
evaporam-se
verão
finda
primavera
VIII
lágrimas
regam
flores
sobre
solo
pedregoso
IX
seus
olhos
molhados
espargem
alma
ressecada
X
choro
fingido
palavras
molhadas
lágrimas
cenográficas
XI
tristeza
particular
alegria
pública
comunicado
lacrimal
XII
sonhos
lágrimas
vêm
e
vão
?
XIII
lágrima
fala
o
que
voz
embarga
XIV
lágrima
divina
ora
brilho
ora
mistério
XV
lágrima
alma
refletida
espelho
de
espelho
XVI
lágrima
cristalina
sombra
de
mistérios
interiores
XVII
vela
choras
lágrimas
de
ceras
crentes
XVIII
lua
gerânios
ciclos
lágrimas
espinhos
fases
XIX
corpo
sem
pouso
lágrima
sem
rosto
XX
concebida
no
espírito
lágrima
nasce
água

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Comentários dos Leitores

01-Parabéns amigos, aldravipeia, uma boa proposta poética. Vou "afiar" as armas. Por enquanto só a primeira aldravia de uma série de vinte.
fiz
rocambole
enrolando
meus
sonhos
açucarados
As outras enviarei depois. Estou no Rio em uma lan house. Abraços,
Amélia Luz. 18/09/2013

02-Andréia e aldravinistas amigos: recebo e aprovo a modalidade: tenho muitas aldravias de um mesmo assunto, escritas encadeadas no ardor da criação...
Clevane Pessoa. 18/09/2013


03 - Caro Donadon
A vida é assim. Surge, caminha, chega a vários lugares e vocês caminham no sentido da beleza. Eu cri que surgiria um fato novo: e ai está. Parabéns.
Abraço,
Gilberto Madeira Peixoto/Suzana. 18/09/2013

04-Caros amigos Andreia e JB Donadon
Parabéns pela Aldravipeia! Achei interessantíssima! Que a criatividade desse brilhante e inteligente grupo mineiro cresça, a cada dia! Vocês são um orgulho para as Minas Gerais!
Abraços a todos e um especial à Andreia!
Maria Amélia Palladino. Presidente da FALARJ- Rio de Janeiro. 18/09/2013

05-Obrigada pelo envio, esse tipo de poesia é muito difícil, mas também muito lindo.
Abraços, Djanira Pio. 18/09/2013


06-CARA E TALENTOSA AMIGA ANDREIA
FIQUEI IMPRESSIONADO COM TUA PERFORMANCE, EXTRAINDO DAS LÁGRIMAS RIQUEZAS POÉTICAS DE INCALCULÁVEL VALOR.
ACEITAS QUALQUER DESAFIO E O FAZES COM BRILHANTISMO INEXCEDÍVEL.
RASCUNHEI DUAS DEZENAS COM A PALAVRA QUASE, UM DIA TE MANDO...
ABRAÇOS DO AMIGO E Admirador: Luiz Gondim - Rio de Janeiro. 18/09/2013

06. Andreia, achei linda sua Aldravipeia, de muita Arte e bom gosto. Só agora tomei contato com essa nova forma, que sem dúvida veio enriquecer a Aldravia e, mais ainda, o trabalho literário de nossa lingua, tal como uma espécie de metalinguagem concebida diferentemente do que já se conhece na poesia tradicional. Parabéns, Andreia por esta contribuição às nossas Letras. Tentarei tb. compor dentro dessa nova concepção poética. Elisa Flores - Rio de Janeiro. 19/09/2013

07. Andreia e J.B. Donadon: Prezados Poetas. Bom dia.
Após ler e reler todas as aldravias que me foram encaminhadas, cheguei à conclusão que Minas é berço de algo indescritível que na realidade assume os extramuros de suas fronteiras e leva arte e beleza da nova poesia para o mundo.
O estilo das aldravias, agora com as inovações, abre um fabuloso leque de interpretações e de emoções.
Vi como Gondim, Gabriel, Messody, Goretti se expressaram e faz-me aqui lembrar das apropriadas azinhagas da vida.
Espero que todos os escritores da Sociedade expressem seus sentimentos por meio do novo modelo que vocês estão a exportar para todos os cantos do planeta. Mais uma vez: Parabéns Deia, Parabéns Donadon. Levem Minas para todos os lugares, pois assim todos nós merecemos...
Grande e fraternal abraço.
Gilberto Madeira Peixoto (Suzana). Sabará, 19/09/2013



 

 

Página criada em 17 de setembro de 2013
Editor: J. B. Donadon-Leal